Lembro-me como se fosse hoje do dia em que fui operado à apêndice. Estava no consultório de um médico no Hospital Dona Estefânia e, após ter visto as minhas análises, o senhor largou a bomba mais ou menos assim: "então... (silêncio e eu já a tremer)... parece-me que tem que levar aí um corte (e aponta para a minha barriga)". A minha primeira reacção foi olhar para a minha mãe e fazer olhos de gato das botas do Shrek, como que a pedir-lhe para me tirar daquele sítio, para não deixar que aquele senhor levasse a ideia avante. Tentei o mesmo com o médico, mas ele continuava irredutível. Foi nesse momento que desatei num pranto. Tinha 11 anos, tão novinho e já a caminho de uma sala de operações. Não é propriamente o que um pré-adolescente deseja. Não querendo exagerar, devo-me ter sentido a pessoa mais injustiçada do mundo. Só que após a operação percebi que havia problemas bem maiores do que o meu. Fiquei internado na ala pediátrica, onde rapidamente percebi que viviam lá muitas crianças e adolescentes. Não, não pensem que eles viviam ali porque tinham doenças gravíssimas que os impedia de estar em casa. Viviam (e ainda vivem) lá porque a família abandonou-os e aquela passou a ser a casa deles. É uma realidade bastante cruel. Nenhuma criança no mundo se devia sentir rejeitada, muito menos pela própria família, mas é o que infelizmente acontece. É nos profissionais de saúde e nas auxiliares que eles têm todo o amor, é às enfermeiras do serviço que eles chamam de mãe. São crianças com uma necessidade de afecto inimaginável. Apegam-se rapidamente a quem passa naquela serviço. Agarram-se às pernas dos pais de outras crianças e pedem que os levem para casa. Para sempre. Por isso, acredito que qualquer acção que tenha como objectivo ajudar as crianças que estão no hospital (seja durante uns dias e acompanhadas pela família, seja porque vivem lá) deve ser apoiada. Portanto, espreitem
esta iniciativa, vale a pena. Uma pequena acção como esta - dar música às crianças - pode fazer a diferença no dia-a-dia delas.